terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Protestos


Esquecer-me de ti? Pobre insensata!
Posso acaso o fazer quando em minh’alma
A cada instante a tua se retrata?
Quando és de minha vida o louro e a palma,
O faro amigo que anuncia o porto,
A luz bendita que a tormenta acalma?

Quando na angústia fúnebre do horto
És a sócia fiel que azinha instila
Na taça da amargura algum conforto?
Esquecer-me de ti, pomba tranqüila,
Em cujo peito, erário de esperança,
Entre promessa meu porvir se asila!

Esquecer-me de ti, frágil criança,
Ave medrosa que esvoaça e chora
Temendo o raio em dias de bonança!
Bane o pesar que a fronte te descora,
Seca as inúteis lágrimas no rosto...
Que, pois, receias se inda brilha a aurora?

Ermo arvoredo aos temporais exposto,
Tudo pode aluir, tudo apagar
Em minha vida a sombra do desgosto;
Ah! mas nunca teu nome há de riscar
De um coração que te idolatra, enquanto
Uma gota de sangue lhe restar!

É teu, e sempre teu, meu triste canto,
De ti rebenta a inspiração que tenho,
Sem ti me afogo num contínuo pranto;
Teu riso alenta meu cansado engenho,
E ao meigo auxílio de teus doces braços
Carrego aos ombros o funesto lenho.

De mais a mais se apertam nossos laços,
A ausência... oh! Que me importa! estás presente
Em toda a parte onde dirijo os passos.
Na brisa da manhã que molemente
Junca de flores do deserto as trilhas
Ouço-te a fala trêmula e plangente.

Do céu carmíneo nas douradas ilhas
Vejo-te, ao pôr-do-sol, a grata imagem,
Cercada de esplendor e maravilhas.
Da luz, do mar, da névoa e da folhagem
Uma outra tu mesma eu hei formado,
Outra que és tu, não pálida miragem.

E coloquei-te num altar sagrado
Do templo imenso que elevou talvez
Meu gênio pelos anjos inspirado!
Não posso te esquecer, tu bem o vês!
Abre-me d’alma o livro tão vendado,
Vê se te adoro ou não: por que descrês?


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